Há três dias que não paro de o ouvir. Há três dias que fui buscar aquele cd à estante, onde o pó não perdoou e ele ficou esquecido. Ainda sei quando o comprei: 26 de Dezembro, 2000, prenda de Natal para mim mesma. Quando tinha de chorar, chorava ainda mais do que tinha, embrulhada na minha camisola verde de lã, no sofá verde também, na caneca de chá e no lenço de papel, na antiga morada. Transportei-me para a menina que deixei lá, nessa casa, para o coração partido por alguém que hoje não ocupa um segundo do meu tempo. Quando a ouço, naquele registo provável de ser a doce voz do amor, sou outra vez essa menina, dou outra vez o primeiro beijo, escrevo outra vez o nome dele no caderno, na mesa. De menina, dou graças por ser mulher, por me ter quebrado tantas vezes às mãos dos meios meninos meios homens que me povoaram. De mulher faço um brinde à sensualidade, à forma feminina que nos permite encostar à parede branca, fria, e dançar, dançar, dançar o swing e o flow que só ela soube inventar em forma de música. Dou, sem pedido, a benção a todos os dias maus do mês, a todas as lágrimas, a todas as crises hormonais de mau-humor, porque é bom ser assim. Numa conversa de amigas, acreditamos em todas as louva-a-Deus e viúvas negras, rimos, e dizemos que somos especiais. E somos.
À mulher que quando canta me faz a mim sentir mulher, Sade Adu, quem mais?
À mulher que quando canta me faz a mim sentir mulher, Sade Adu, quem mais?
Post Scriptum em forma de dedicatória - "e a mais bela de todas, Emma, foi a primeira que numa noite de Outono, sob a folhagem ondulante do ulmeiro, meu deu a beijar os seus seios acastanhados, me deu a beber a taça da volúpia", Hermann Hesse. Obrigada, foi o grand finale para a nossa discussão feminina/feminista.